BUMBA-MEU-BOI
Foi há muito tempo que tudo aconteceu. Havia um fazendeiro muito poderoso e malvado como não sei o quê. Era dono de seringais que se estendiam a perder de vista. Ali trabalhavam vários empregados, entre eles um caboclo idoso chamado Pai Francisco, cuja mulher estava grávida. Um dia, a sua esposa, uma tal de Catirina, virou-se pro marido e falou:
- Francisco, tô com desejo de comer língua de boi.
-Você ficou louca? - reagiu ele.- Desde quando que gente pobre igual a nós pode comer carne? Já esqueceu que o gado pertence ao patrão?
A mulher era teimosa e insistiu:
- Eu tenho uma idéia. Você não precisa matar o boi. Basta cortar a língua dele e pronto. Ninguém vai desconfiar.
Pai Francisco, preocupado com a saúde da criança que em breve iria nascer, fez a vontade de Catirina.
No mesmo dia, ao anoitecer, aproveitando-se da escuridão, rastejou até o curral, tomando cuidado para não despertar os vaqueiros que vigiavam os animais. Laçou o boi mais gordo e levou-o para o interior da mata.
Com um golpe de facão, decepou a língua do bichão e deixou-o amarrado num tronco de árvore. Feliz da vida, correu até o seu casebre com o naco de carne sangrento nas mãos.
Naquela noite, Catirina comeu tanto que sua barriga parecia que ia estourar.
Na manhã seguinte, Pai Francisco voltou ao lugar onde tinha deixado o boi. Para seu desespero, o bicho não resistira ao ferimento e estava moribundo, estrebuchando ao pé da árvore.
- E agora, meu Deus? - lamentou-se.
Enquanto isso, na fazenda, o patrão já tinha dado falta do seu boi de estimação. Preocupado e já demonstrando irritação, mandou chamar o capitão-do-mato e ordenou-lhe:
- Pegue os índios e trate de achar o animal.
Naquela época era comum haver índios a serviço dos brancos, pois não havia rastreadores melhores do que eles. Batizados, viviam como agregados nas fazendas, depois de terem sido obrigados a renunciar a seus deuses e costumes.
Os índios em pouco tempo, acabaram descobrindo as pegadas deixadas no solo recoberto de folhas, guiando o caçador de fugitivos até o local aonde o boi havia sido levado. Chegaram a tempo ainda de encontrar Pai Francisco, todo descabelado, na maior angústia, tentando reanimar o bicho.
O capitão-do-mato, ao ver o touro agonizando no chão, mandou buscar o doutor. O médico, um tremendo charlatão que vivia na sombra e água fresca às custas do patrão, veio correndo com a sua maletinha debaixo do braço.
O doutorzinho, após fingir examinar o bicho, diagnosticou:
- Esse não tem mais jeito.
Até o vigário, outro espertalhão, foi convocado às pressas para ver se curava o boi. O padre, que de religioso não tinha nada, benzeu sem muita convicção o animal moribundo.
Mas depois de várias tentativas acabou desistindo também:
- Não posso fazer milagres – desculpou-se, na hora em que o bicho dava o último suspiro.
Pai Francisco, coitado, foi amarrado e levado a presença do fazendeiro, seguido pelos índios que carregavam o touro, já duro que nem uma pedra.
O caboclo, cabisbaixo e morrendo de medo, confessou a sua culpa.
- Foi tudo por causa da minha mulher. Ela está grávida e queria comer língua de boi. Mas eu não tinha intenção de matar ele não – soluçou, pedindo perdão.
O fazendeiro não era homem de ter misericórdia de ninguém. Nem os apelos da sinhazinha, a sua filha que estudava na cidade grande, o fizeram mudar de opinião.
- Amarrem esse desgraçado no tronco – sentenciou.- Arranquem o couro dele a chibatadas e depois expulsem ele e a mulher pra longe de minhas terras.
As ordens foram cumpridas imediatamente. Pai Francisco apanhou de fazer dó. Seus gemidos ecoaram pelas copas das árvores ante a indiferença do patrão, do médico e do padre.
Logo após o terrível castigo, o velho,com as costas todas lanhadas pelo chicote do capataz, arrumou a sua trouxa e partiu cambaleante, com a mulher barriguda, mata adentro.
No meio do caminho o casal de retirantes encontrou um pajé. Nem todos os indígenas se sujeitavam ou se convertiam à religião dos brancos. A maioria, guerreiros valentes, os verdadeiros donos da terra, habitava o coração da gigantesca floresta.
O índio com o peito coberto de colares e amuletos, que surgiu como num passe de mágica à frente de Francisco e Catirina, era um curandeiro, conhecedor dos segredos e plantas da imensa mata. Desde muito jovem aprendera os mistérios da magia passados de geração a geração por homens velhos e sábios. A arte de curar também lhe havia sido transmitida por seus ancestrais e de suas conversas com as divindades no alto da montanha sagrada.
Graças às ervas medicinais que o pajé trazia numa bolsa de palha, as feridas das costas do caboclo cicatrizaram milagrosamente.
Ao entardecer, os empregados da fazenda se assustaram ao verem Pai Francisco e a mulher retornando ao lugar de onde haviam sido expulsos, acompanhados pelo pajé.
- Chamem o boi – disse o curandeiro.
Diante de olhares atônitos, o índio se ajoelhou ao lado do corpo do animal, que ainda não havia sido esquartejado, e expirou várias vezes sobre ele. Para espanto de todos, o bicho sacudiu-se todo, abanou as orelhas e a calda, e num pulo só, ficou de pé.
Ao ver o touro ressuscitado, o patrão perdoou o homem e a esposa e os readmitiu na fazenda.
- É por isso que todos os anos, em vários lugares do Brasil, se faz uma festa pra comemorar a ressurreição do boi.
AAAAAAAAAAAAAAdorei seu blog, me ajudou em trabalhos escolares!
ResponderExcluirjá tinha ouvido varias história do bumba-meu-boi...mais essacompletou minhas dúvidas...além de ser muito boa para ser trabalhada com crianças...Prarabéns...adorei
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